O QUE É TRANSTORNO BIPOLAR?
Giovani Missio
Transtorno bipolar é uma doença do humor que envolve crises de depressão alternadas com crises de euforia ao longo da vida.
INTRODUÇÃO.:
Variações de sentimentos de acordo com experiências e situações são normais e fazem parte da vida de todos os seres humanos. A alegria de encontrar um velho amigo ou a tristeza por perdê-lo são consequências naturais relacionadas a estas experiencias. São esses sentimentos que dão os sabores das experiências que vivenciamos. Esses sentimentos naturais são normais, diretamente ligados à uma vivência ou representação mental e geralmente passageiros. Estas emoções que acompanham, caracterizam, ou digamos, dão o sabor a cada situação, têm o nome de Afetos.
Além destas emoções que carimbam cada experiência em particular, existe uma emoção que permeia a vida de uma maneira um pouco mais constante. Um estado de ânimo ou disposição afetiva de fundo.1 Essa emoção de fundo mais constante damos o nome de Humor. O Humor adequado é aquele que deixa transparecer os afetos.
Algumas pessoas sofrem de uma persistência de fortes sentimentos, algumas vezes sem causa aparente, que permeiam suas vivências e influenciam seus comportamentos. Dito de uma outra maneira, apresentam um estado de humor intenso e persistente que impede a expressão adequada dos afetos relacionados a cada situação. Estas pessoas sofrem de um “Transtorno afetivo”, ou “Transtorno de Humor”.
O Transtorno de Humor ou Afetivo popularmente mais conhecido é a Depressão. A pessoa com depressão sente tristeza, angústia, ansiedade, desânimo e falta de energia. Também se sente apática, perde a motivação, tudo fica sem graça ou sem sentido, nada satisfaz. Torna-se negativista e preocupada com tudo. Afeta o organismo como um todo, comprometendo também, sono apetite e a disposição física. Apresenta dificuldades de concentração, esquecimentos e raciocínio lento, além de frequentemente apresentar dores e outros sintomas físicos. Não são necessários todas essas características para um diagnostico de depressão.
De maneira objetiva cinco dos sintomas da tabela abaixo, sendo um deles humor deprimido ou perda do interesse e prazer, por pelo menos 2 semanas, já configuram um quadro de depressão.
Critérios para Depressão |
(1) Humor deprimido na maior parte do dia quase todos os dias. (2) Prazer ou interesse diminuidos por quase todas as atividades na maior parte do tempo quase todos os dias. (3) Diminuição ou Aumento de peso ou apetite (4) Insonia ou muito sono quase todos os dias (5) Agitação ou lentificação motora observada por outras pessoas (6) Fadiga ou perda de energia (7) Sentimento de inutilidade ou ideias de culpa (8) Dificuldades de concentração, indecisão ou dificuldades para pensar (9) ideias de morte (vontade de morrer) ou de suicídio. |
Além da depressão, algumas pessoas apresentam, eventualmente, um quadro oposto ao da depressão. Este outro polo do humor, elevado, leva o nome de “Mania”. È assim chamado devido à historia do seu conceito que vem desde a Grécia antiga quando se referia à Euforia ou “sopro de inspiração divina”. Nada tem a ver com o conceito popular de manias no sentido de hábitos, costumes ou repetição de um comportamento. Não se refere à ideia de: “mania de alguma coisa”.
A “Mania” é uma elevação do humor em que a pessoa sente uma alegria ou irritabilidade intensa, podendo chegar a ficar eufórica ou furiosa. Tem convicção de poder e de grandeza, fica bastante otimista. Apresenta aumento da energia e da disposição para atividades, diminuição da necessidade de sono. Frequentemente fala com rapidez e com um volume da voz aumentado, sendo difícil interromper para dar alguma opinião. Tem também aumento da impulsividade, dos gastos e pode haver aumento consumo de substâncias como cigarro, alcool e drogas. Há também aumento da produção mental como a criatividade e a capacidade de raciocínio. Eventualmente os pacientes mais graves podem ter sintomas psicóticos como ouvir vozes e ter distorcida a percepção da realidade. Da mesma maneira que a depressão não são necessários todos esses sintomas, apenas alguns e pelo período de ao menos 1 semana.
Critérios para Mania |
Período de 1 semana de elevação do humor: euforia ou irrtabilidade acompanhado do inicio de 3 de quaisquer sintomas abaixo. (1) Autoestima inflada ou grandiosidade (2) Necessidade de sono diminuída (dorme pouco e já sente-se disposto) (3) Falar mais que o habitual, tagarelice ou pressão para falar, dificil interromper a fala (4) Fuga de ideias (esquece o que estava falando, perde a linha do raciocinio) ou sensação de que os pensamentos estão correndo (pensando muitas coisas ao mesmo tempo). (4) Distraibilidade (distrai-se facilmente com qualquer estímulo) (5) Aumento da atividade (exemplo: diverte-se mais, trabalha mais ou aumenta a atividade sexual) ou agitação motora (6) Envolvimento em atividades prazerosas com potencial de risco (exemplo: gastos financeiros sem necessidade, indiscrição sexual, abuso de drogas ou bebidas, etc) |
Uma característica das pessoas que apresentam um episódio de Mania ou Hipomania é a oscilação em algum momento para um humor deprimido e principalmente a ocorrência outras vezes de mania e depressão. Estas oscilações caracterizam o “Transtorno Afetivo Bipolar” ou “Transtorno Bipolar do Humor”, doença que se não tratada pode ser grave e incapacitante.
QUAIS OS TIPOS DE TRANSTORNO BIPOLAR
Apesar da substituição do antigo nome de Psicose Maniaco Depressiva por Transtorno Bipolar esta doença ainda sofre um importante preconceito que subjuga os pacientes portadores, dificulta o diagnóstico e afasta outros do tratamento. Muito deste preconceito se deve à concepção equivocada de que o Transtorno Bipolar é uma doença de apresentação única e estigmatizante.
Popularmente tem-se idéia do paciente portador de transtorno bipolar como uma figura estereotipada, que apresenta suas oscilações de humor muito intensas, com picos altos e baixos bastante amplos e marcantes. Uma pessoa exagerada, impulsiva e difícil de lidar-se. Isto não é de todo verdadeiro.
O transtorno bipolar tem um continuum ou espectro de apresentação. Ou seja, existem pacientes que quando doentes tem claros sintomas psicóticos. Estes pacientes ouvem vozes que outros não podem ouvir e tem sua percepção da realidade distorcida, com certeza de ruína na depressão e de grandeza nos períodos de mania. Entretanto existem também pacientes que apresentam, ao invés deste quadro clássico, curtos períodos de tempo em que ficam mais ativos, ligeiramente mais criativos, trabalham mais, dormem um pouco menos, ficam ligeiramente mais irritados ou impulsivos e em outros momentos ficam ligeiramente mais deprimidos. Estes quadros de mais leves são chamados “Hipomania” e além de serem mais suaves tem duração mais curta, levando 3 a 4 dias para desaparecerem espontaneamente. De maneira geral é mais dificil de ser diagnosticada pois passa desapercebida pela maioria dos pacientes e familiares. De tão leve muitas vezes e confundida com um jeito mais extrovertido ou irritado de ser que chamamos “temperamento”. O transtorno bipolar apresenta-se entre estes dois extremos, do temperamento extrovertido aos quadros graves. Esta diversidade de graus na apresentação damos o nome de “Espectro Bipolar”.
Para facilitar um pouco as coisas, dividimos a classificação em basicamente duas categorias: Transtorno Bipolar do tipo I, os mais graves e Transtorno Bipolar do tipo II, os pacientes mais leves.
Apesar da menor intensidade é importante que também os pacientes mais leves sejam devidamente tratados. Grande parte dos pacientes do tipo II (mais leves) passam grande parte do tempo deprimidos mas apresentam eventuais e discretos, curtos e quase imperceptíveis períodos de elevação do humor. Desta forma, esses pacientes são erroneamente diagnosticados e tratados como tendo apenas depressão. Isto acarreta que nunca tenham uma melhora completa e eventualmente piorem dos sintomas no longo prazo com um tratamento errado.
Pacientes doentes e sem tratamento há muito tempo ou pacientes erroneamente tratados como deprimidos unipolares evoluem com mais prejuízo em suas vidas e mais dificuldades no tratamento da doença. Frequentemente devido ao tratamento inadequado passam a apresentar um tipo de oscilação mais rápida, ou “ciclagem rápida” em que têm seguidas crises de depressões e manias ou hipomanias.
Além disto, ainda alguns pacientes inadequadamente tratados podem apresentar uma mistura de sintomas de depressão e de mania ao mesmo tempo, ou um “episódio misto”. Nestes casos os pacientes podem ter uma tristeza importante, angustia, desesperança, pessimismo, mas ao mesmo tempo sentem-se agitados, cheios de energia, muito irritados e explosivos, tem insônia pela noite e dormem de dia.
Como vimos, o Transtorno Bipolar é uma doença de apresentação bastante variada. Além disso, os pacientes bipolares apresentam com frequência comorbidades. Ou seja, possuem quase sempre outras doenças psiquiátricas associadas com o transtorno Bipolar. Podem ser sintomas de ansiedade generalizada, TOC, fobia social, síndrome do pânico e abuso de substâncias entre outras. Muitas dessas doenças são tratadas com antidepressivos, que pioram os sintomas de bipolaridade. Assim os pacientes bipolares que procuram tratamento para sintomas de ansiedade e que fazem uso de antidepressivos podem piorar do seu quadro de ansiedade ao invés de melhorar.
Por tudo isto, por toda essa gama de apresentação e complicadores é importante que os pacientes com sintomas de Bipolaridade tenham acompanhamento médico regular. Mesmo pacientes com sintomas depressivos e ansiosos, devem ser criteriosamente avaliados quando ao desenvolvimento de sintomas maniacos ou hipomaníacos durante o tratamento, desta forma evitando a piora de uma situação preexistente.
IMPACTO
Somente na última década iniciaram-se esforços mais intensos para se determinar a magnitude do transtorno bipolar na sociedade. Pouco se sabia antes disto devido às dificuldades técnicas e metodológicas para se realizar este tipo de estudo e pela crença de que o transtorno bipolar era uma doença rara, com isto pouco incentivo era alocado para estas pesquisas. Estudos recentes tem encontrado taxas de ate 10,9% na população geral2 . Outro estudo evidenciou que 8,3% da população na cidade São Paulo sofre com alguma forma da doença3. Sabe-se além disso que mulheres desenvolvem as formas graves da doença duas vezes mais que os homens4. Entretanto os estudos são incertos ainda nesse sentido quanto as formas mais leves.
Outro fator relevante são os prejuízos sociais. O transtorno bipolar geralmente tem inicio precoce situando-se entre as idades de 10 e 30 anos principalmente acometendo uma fase importante do desenvolvimento pessoal, social e profissional. Temos observado o inicio dos sintomas por volta dos 15 anos, o inicio do tratamento por volta dos 22 e a primeira internação por volta dos 25 anos de idade5. Entre as mulheres parece haver um segundo período em que passam a apresentar a doença, que é por volta dos 45 e 50 anos4.
Levando em conta o fato de ser uma doença com inicio bastante precoce na vida de seus portadores e de infestação tão vasta na população estima-se que o prejuízo social seja astronômico. Calcula-se que só em 2009 os Estados Unidos tenham perdido pelo menos 151 bilhões de dólares com o Transtorno Bipolar6. Um outro estudo da Organização mundial de saúde em associação com o Banco Mundial o transtorno bipolar do tipo I exclusivamente, foi a sexta maior causa de incapacitação para o trabalho no mundo. Isso sem levar em conta as formas mais leves. Não estranharíamos portanto se essa doença passasse a ocupar o primeiro lugar7.
O impacto negativo da doença na vida dos pacientes é alto. Cerca de metade dos pacientes apresentam importantes dificuldades de ajuste social e ocupacional, como manter relações com amigos e familiares ou se encarregar de atividades de trabalho e lazer, mesmo nos períodos fora das crises8. Para além disso, estima-se que um adulto desenvolvendo transtorno bipolar por volta dos 20 anos, perca efetivamente 9 anos de vida, 12 anos de saúde normal e 14 anos de trabalho9.
QUAL A CAUSA DO TRANSTORNO BIPOLAR
O Transtorno Bipolar não tem uma causa única definida. São vários os fatores envolvidos sendo o mais importante uma predisposição genética. Não há um gene especifico para o transtorno bipolar. Vários genes interagem na disposição à doença. Esses genes controlam o funcionamento interno dos neurônios e a relação química e elétrica entre eles. Em menor grau outros fatores estão também relacionados, como o desenvolvimento neurológico, intelectual e social. È comum que amigos e familiares de pacientes tentem justificar a doença com qualificativos morais como “preguiça”, “falta de caráter”, “chantagem” para os sintomas depressivos por exemplo. Nos episódios de mania (euforia) o paciente se sente extremamente bem, tem aumentada sua disposição para as atividades e por isso o próprio paciente e algumas vezes os familiares, tendem a compreender estes sintomas como vantagens e recusar qualquer sugestão de que isto seja uma doença. Dependendo da intensidade, do comportamento relacionado e do grau de prejuízo, esses sintomas de euforia podem ser vistos erradamente como qualidades pessoais ou também como defeitos morais. Eventos estressantes podem eventualmente estar relacionados aos desencadeamento das crises depressivas ou de mania, mas não são responsáveis pela doença. Portanto, o Transtorno Bipolar é de causa primariamente neurobiológica.
TRATAMENTO
O tratamento do transtorno bipolar tem a intenção não apenas de curar um episódio depressivo ou maniaco isolado, mas principalmente tratar a doença toda, evitando novos períodos de depressão ou de euforia. Este tratamento é invariavelmente medicamentoso e de longo prazo.
As medicações usadas são os “estabilizadores de humor”. Os mais comuns são o carbonato de lítio, que é um tipo de sal e os anticonvulsivantes, que são medicações para o tratamento da epilepsia. Especula-se que as oscilações de humor no transtorno bipolar envolvam um mecanismo parecido com as convulsões, um aumento de descarga elétrica em toda a rede de neurônios, porém bem mais lento e gradual10. Os estabilizadores de humor são medicações bastante seguras e eficientes porém com limitações e particularidades que devem ser consideradas a cada caso. Alguns pacientes podem se adaptar muito bem com um remédio em particular e não tão bem a outros. O tratamento ideal para cada paciente é aquele com maior eficacia e menor reação adversa, ou seja, melhor custo benefício. Para descobrir esse tratamento ideal, ou o que o paciente melhor se adapte, não existe outra maneira a não ser tomar a medicação, sempre sob orientação de um médico. Algumas vezes há dificuldades em encontrar o medicamento ou combinação ideal e essa busca do tratamento mais adequado pode levar algum tempo.
Principais Estabilizadores de Humor Utilizados no Tratamento do Transtorno Bipolar |
Carbonato de Litio (Carbolitium® ) Acido Valproico/Divalproato de Sódio (Depakene® Depakote® , Valpakene® ) Carbamazepina (Tegretol® , Tegretard® ) Oxcarbazepina (Trileptal® ) Lamotrigina (Lamictal® , Neural® ) |
Geralmente se inicia o tratamento em uma crise seja de depressão, mania ou quadro misto, já que é em uma crise que o paciente ou a família procura um médico. Nestes períodos de crise são usados mais medicações e doses mais altas. Havendo melhora da crise e após um período variável de tempo, deixa-se uma dose menor, de manutenção, com o intuito de evitar as recorrências.
Além dos Estabilizadores de Humor, que são os principais medicamentos no tratamento do transtorno bipolar, eventualmente pode ser necessário utilizar outros tipo de medicações. Os mais comumente utilizados são os Antipsicóticos e os Antidepressivos.
Nos casos mais resistentes ou de maior gravidade utilizam-se medicações chamadas antipsicóticas. Como sugere o próprio nome são precisamente indicadas quando existem sintomas psicóticos (delírios ou alucinações). Entretanto e apesar do nome, são indicadas em outros casos mesmo não havendo tais sintomas. Os efeitos adversos mais comuns são ligeiros ganho de peso, sonolência e há a possibilidade de ocorrerem tremores. Na tabela abaixo estão as mais utilizadas.
Principais Antipsicóticos Utilizados no Tratamento do Transtorno Bipolar |
Quetiapina (Seroquel® ) Olanzapina (Zyprexa® ) Risperidona (Respidon® , Zargus® , Riss® ) Aripiprazol (Abilify® ) Ziprasidona (Geodon® ) |
Os Antidepressivos são medicações que podem piorar ou agravar um quadro de bipolaridade. Devem ser evitados ou usados com muita cautela no Transtorno Bipolar. Podem fazer com que os pacientes passem mais rapidamente de um polo a outro, tendo várias crises seguidas, ou levar a misturar sintomas de euforia/irritação com depressão. Entretanto, quando bem indicados, em doses pequenas, associados com estabilizadores de humor e por curto período de tempo, podem ser utilizados no tratamento dos sintomas depressivos e ansiosos. De maneira geral tenta-se ao máximo evitar o uso de antidepressivos no tratamento do transtorno bipolar.
Principais Antidepressivos Utilizados no Tratamento do Transtorno Bipolar |
Fluoxetina (Prozac® ) Sertralina (Zoloft® e Torest® ) Paroxetina (Aropax e Pondera® ) Citalopram (Cipramil® ) Escitalopram (Lexapro® ) Venlafaxina (Efexor® ) Mirtazapina (Remeron® ) |
Podem ocorrem momentos em que os pacientes mais graves, deprimidos ou em mania, necessitem de internação. Isso acontece obviamente quando há risco para a vida do próprio paciente ou de outras pessoas; quando há agitação muito grande em que o é difícil para o paciente conseguir se manter parado ou calmo; quando há risco de constrangimento ou de prejuízos de qualquer natureza ou quando há dificuldade em aceitar ou realizar o tratamento adequadamente.
É importante também lembrar que em alguns casos de maior gravidade principalmente quando há sintomas depressivos muito intensos ou sintomas psicóticos graves é indicado tratamento de choque. Para se fazer uma boa medicina e uma ciência devemos limpar a consciência de preconceitos e deixar o pensamento fluir pelos fatos e pela razão. Apesar do entendimento e aperfeiçoamento da técnica que existe hoje, a Eletroconvulsoterapia ou ECT como é chamada, é pouco utilizada devido ao preconceito, até certo ponto compreensível, decorrente mau uso desta técnica alguns anos atrás.
O mecanismo pelo qual a técnica funciona é análogo ao do Desfibrilação Cardíaca (o choque no peito quando há uma parada cardíaca). Um coração tem indicação de receber um choque quando o impulso elétrico nervoso que determina o batimento fica espalhado desordenadamente por todo o coração impedindo sua contração. Ninguém teria preconceito de levar um choque no peito numa circunstancia desta. Analogamente, podemos entender um quadro de alteração grave do humor como havendo uma estimulação excessiva e desorganizada na rede de neurônios. Em qualquer dessas duas situações, um impulso elétrico controlado “limpa”, reorganizada, ou seja, estabiliza eletricamente o funcionamento tanto cardíaco como da mesma maneira o funcionamento cerebral.
A ECT é extremamente eficaz, traz resultados bem mais rápidos que as medicações. Entretanto, requer um centro especializado pois o paciente deve ser anestesiado e preparado com cuidados especiais de enfermagem, quase como se fosse ser submetido à uma cirurgia. Ao invés de ser cortado com um bisturi o paciente recebe um estímulo elétrico de intensidade e duração previamente calculadas. A intensidade da corrente elétrica é cerca de 10 vezes menor que a aplicada em uma desfibrilação cardíaca e a duração raramente passa de meio segundo. É tão segura que é o tratamento preferível para as gestantes e os idosos.
A psicoterapia, tratamento psicológico baseado na conversa do paciente com um terapeuta é indicado de maneira a auxiliar ao tratamento medicamentoso. A psicoterapia sozinha não trata nem previne episódios de depressão ou de mania. Psicoterapia ajuda o paciente a elaborar as conseqüências da doença e a se reestruturar psicologicamente. Por aumentar o entendimento do processo da doença aumenta também a adesão ao tratamento. A psicoterapia também pode dar instrumental ao indivíduo para identificar e resolver conflitos, assim diminuindo o impacto provocado pelo estresse.
Como qualquer outra doença o transtorno Bipolar exige um tratamento adequado o qual irá apresentar alguns efeitos colaterais, que em geral são leves, toleráveis e a grande maioria tende a desaparecer após algum tempo de uso da medicação. Em geral o primeiro mês de tratamento visa-se mais a adaptação que uma melhora mais significativa. Se tolerados alguns eventuais efeitos desagradáveis, vai gradativamente surgindo uma melhora do humor. De acordo com a tolerabilidade e a melhora obtida serão feitos os ajustes de dose ou de associação com outras medicações.
O tratamento não impede completamente que hajam oscilações no humor, mas permite oscilações mais adequadas a cada experiência e cada momento de vida. Desta forma continua-se sentido alegria e tristeza eventuais porém sem os prejuízos sociais, econômicos, de trabalho e de relacionamentos que ocorrem durante as crises mais intensas.
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